Wednesday, June 27, 2007

Uma Pequena Maravilha

Antes de começar mesmo, vou fazer uma introdução. Quero confessar aqui que eu era fã da Vicky. Lembram-se da Vicky? Aquela miúda robot, a pequena maravilha de uma sitcom da RTP1? Rodava assim a cabeça e fazia contas e deitava papel pela boca, como uma xerox. Eu era apaixonado pela Vicky. Isto é uma introdução muito criativa. No entanto, não sei muito bem como relacioná-la com o tema principal do texto. Na verdade, ainda não sei muito bem qual é o tema principal do texto. Alguma coisa há-de arranjar-se. Em último caso, meto-a no título. Resulta sempre. Este tipo de explicações que eu vos dou pode soar meio estranho. No entanto, é uma forma propagandística de vos instruir. No fundo, estou a manipular-vos, a moldar-vos as ideias, concedendo-vos a ilusão de estarem a aproximar-se do meu esquema de pensamento que tão magníficos frutos costuma dar. Pois, desenganem-se. Eu não estou aqui para ensinar ninguém, eu estou aqui para falar de... cenas.
Uma coisa que gostava na Vicky - a-ah!, eu sabia! - era da indumentária. Vermelha e branca, como manda a regra, inspirada na Digníssima Veste que tantas vezes protegeu do frio e da lama heróis imortais, de Coluna a José Águas, de Torres a Chalana, de Paneira a João P...pfff... a Simão Sabrosa, e por aí fora. Acresce que ela tinha aquele aventalzinho por sobre o vestido. Hoje em dia não me fica bem comentar a situação. Mas, na altura, eu ainda era menor de idade, pelo que me era permitido ter fantasias a puxar ao sem-vergonha. Ainda que na época fossem um tanto rudimentares. Entretanto, e sobretudo desde aqueles 17 meses que passei numas águas-furtadas de Santa Apolónia, amadureci e adquiri conhecimentos...
Bom, falávamos nós de futebol, portanto. Peguemos na expressão "pequena maravilha". Muita coisa podia estar associada a esta expressão. Pena que nenhuma delas pudesse ser do Benfica - tirando a Vicky, claro... -, uma vez que no Glórias as coisas são sempre de "grande" para cima. Ora, isto esvazia quase por completo o objectivo da prosa. E começa a faltar-me a imaginação para tornar este texto inteligível. No entanto, o "golo" desta criação não passava por estabelecer uma comunicação propriamente dita com os leitores do blogue. Tinha antes como desejo não tocar uma única vez no nome desse tal comendador madeirense que financia a Fátima Lopes (diz-se...) e, por outro lado, dar os parabéns aos praticantes da única modalidade que verdadeiramente dignificaram a veste do meu clube. Refiro-me, obviamente, aos jogadores da equipa de futsal, vencedores da Taça de Portugal e do Campeonato. Pena que a vitória na final do campeonato tenha sido contra uma equipa tão medíocre. Mas pronto. Vitórias são vitórias e o troféu já cá canta. Podia falar também da Taça da Liga ou da ida do Henry para o Barcelona (que desilusão...). Mas agora é tarde demais porque o texto está um bocado comprido e a Helena não pára de me pressionar "tu tens de escrever, malandro! Escreve... ando eu e o Vinhas aqui a trabalhar para ti e tu na praia, a beber sucos exóticos, a ver biquínis arejados, a pôr creme nas bifas... a vida não é só isto!". Posto isto, o melhor é proceder à publicação da coisa. Espero que tenham gostado. Eu achei o texto uma pequena maravilha.

Monday, June 25, 2007

Receita para um grande clube (Souflé de S.L.Berardo)

Ingredientes:
Um capitalista abastado com relações com o Estado;
Um Presidente;
Um maço de SG Ventil;
50 Cotonetes;
Uma jornalista;
Acções de SAD desportiva.
Coloca-se o capitalista em vinha de protagonismo mediático durante três meses, temperando-o com OPA, arte contemporânea e especulação bolsista.
Deixe marinar.
Entretanto, faz-se uma massa com acções desvalorizadas, um presidente com dificuldades de articulação do discurso. Amassar insistentemente até ficar com um tamanho diminuto. Juntar SG Ventil e deixar levedar até o ponto de desaparecer.
Com um pouco da massa, faz-se um molho de jornalista (a massa é para engrossar!), juntando folhas, gravações de entrevistas maldizentes até ficar em ponto de livro. Serve-se o livro à Comunicação Social de Lisboa para ganhar consistência.
Quando estiver a ferver em ponto de Processo, põe-se alguém a procurar queixas arquivadas e desarquiva-se para mantê-lo picante.
Entretanto o capitalista esta pronto para investir os ganhos especulativos e a transferir o subsídio do Estado. Inchado até o ponto Abramovic, deixa-se desabafar contra símbolos do clube e dar palpites sobre a equipe até ser necessário continuar a apimentar o molho para não dar nas vistas.
Depois de pronto para assumir os destinos do clube, compram-se jogadores caros, para juntar a massa que vai sendo regada com o molho de jornalistas.
Com tudo devidamente ligado, põe-se num estádio a cozer uma época à espera do fim do campeonato.
Pode ser servido de duas maneiras: com título, faz-se a grande festa e cantam-se loas a visão do homem que devolveu a glória ao cozinhado; sem título, frita-se o presidente em torresmos e vende-se devagarinho junto com as acções e jogadores para cobrir o prejuízo.
Ah! Os cotonetes são decoração.


Vinhas

Wednesday, June 20, 2007

Socorro! O Joe descobriu o Benfica

Há personagens que me aborrecem, são aquelas que não sabemos porquê, mas estão constantemente a entrar pela casa dentro, telefonam se não nos encontram, estão à janela quando saímos à pressa para o supermercado e... o Joe Berardo. O Joe Berardo não descansa enquanto não entra diariamente nas casas dos 10 milhões de compatriotas, fala-se de arte contemporânea e do sucesso de Serralves? Lá vai o Berardo com a sua colecção de arte (que nós lhe compramos); uma comenda? Já tem; há opa na PT? Lá vai o Berardo; estudam-se locais para aeroportos? Chega o Berardo. E o Berardo é honesto, não é especialista em nada, mete-se em tudo, não se metendo, porque o Berardo opina sem opinar, os outros é que são competentes e sabem, mas o Berardo entende que se pode fazer melhor. E depois trata-nos como se fôssemos da família, todos, nós, (you know?) o Rui Costa, o Figo, o jornalista que o entrevista e eu que não consegui fugir-lhe com o zap. Mais, mistura inglês com madeirense, calão nas duas línguas e o seu blazer preto, contemporâneo, cosmopolita, o pin charmoso e discreto "I love Benfica" - you know?

Na Madeira há duas pragas, o Alberto João e o Joe Berardo, sempre estive certa disso, mas o pior é que não vejo forma de me libertar destas espaçosas presenças. Um é eleito sucessivamente, vá-se lá saber porquê (nestas alturas acho o sistema democrático esquisito - ainda assim, concordo que o pior sistema se excluirmos todos os outros). Agora aconteceu o pior. Era o que eu temia, o Berardo descobriu a maneira de nunca deixar um cidadão em paz - o Benfica.

Começa por "opar" 60% das acções, e diz nada querer do clube até porque nada percebe de futebol (esta parte até deve ser verdade). O certo (e incomodativo) é que agora aparece um dia a dizer que o clube parece um Lar de Terceira Idade, isto afirmado logo depois de ter avisado que nada percebe de futebol e que o benfica tem, nessa área, gente da maior competência; no dia seguinte vai mais longe e diz que o Rui Costa devia reformar-se, depois pede desculpa "ao h'mem, se for preciso man, peço p'ssoalmente desculpa ao h'mem, qu'eu conheço o h'omem", para depois aumentar a percentagem "opada" e não deixar esmorecer o interesse. E mais, é que tratando-se do Benfica os temas não vão acabar nunca. Mas nunca.

Agora toda a imprensa vai trazer o Joe na capa, os telejornais mostram-no diariamente, não tarda será a personagem entrevistada pela Judite de Sousa e percorrerá todos os entrevistadeiros nacionais, enfim...

O pior é que não se adivinha fim para a novela, o Berardo já percebeu, esta é a fórmula, a lâmpada genial, sim o Benfica permitirá ao Joe nunca sair da ribalta, doa a quem doer, e a mim está a doer bastante - é que aturar o singelo nacional-benfiquismo é uma coisa (pode até ser divertido), levar com o Joe é outra!

Monday, June 04, 2007

Em equipa que ganha não se mexe?

Estou em crer que as verdades absolutas já não são o que eram. Antigamente, no meu tempo de miúdo, a nossa equipa ganhava e era a melhor possível. Os jogadores eram nossos, passavam anos no clube e só iam para um clube estrangeiro, maior que os nossos sonhos.
Mas eram poucos. O normal era identificarmo-nos com os nossos ídolos de sempre. Por vezes, quando os carolas da equipa faziam um bom negócio e o dinheiro tinha de desaparecer, não fosse o Estado levá-lo em algum imposto injusto, lá vinha um estrangeiro, daqueles de ficar de boca aberta e que nós sabíamos ia resolver os jogos todos.
Era o tempo em que a equipe, se ganhava ou perdia, não importava, era nossa. Se perdíamos o treinador mudava, um ou dois malandros eram mandados embora no final da época e a vida seguia, simples e serena como a nossa equipa.
Depois vieram outros tempos. De repente, deixamos de jogar futebol. Os miúdos, não sei se pelas ruas terem ficado mais perigosas ou o trânsito aumentado, deixaram de jogar à bola na rua e com isso, ao que parece, o número de craques desceu. As equipas – as nossas e a dos adversários – passaram a ter nomes estrangeiros em abundância (vindos de países onde ainda se jogava bola na rua), uns bons e outros muito maus que até nem se percebia porque estavam na nossa equipa.
Assim como quem estava a dormir, a rua deixou de ser escola e passou a antro marginal. Os nossos pais arranjaram televisão a cores, aumentaram o número de canais e as parabólicas proliferavam como se fossem baldes de informação a ferver nos telhados. Ficávamos mais tempo em casa e já nem íamos aos jogos porque a parabólica custou caro e não havia dinheiro para ir ao estádio. Mas saímos a ganhar porque víamos os resumos dos jogos espanhóis, franceses e polacos (junto com uns filmes bem malandros que passavam tarde…).
E de repente a malta deixou de jogar e os estádios estavam cheios de nomes estranhos que os locutores chamavam de forma diferente para aumentar ainda mais a confusão.
Já não conseguíamos saber a nossa equipa de cor. Três vezes por ano chegava uma carga de nomes novos e não havia volta a dar.
Aquela memória prodigiosa que nos anos 60 e 70 era capaz de dizer a constituição das duas equipas no jogo Porto x Sporting, (por exemplo) da época 71/72 acabou. Porque antes só tínhamos de decorar os suplentes ou quem substituía um ou outro lesionado.
Pensava eu que haveria mudanças a partir do momento em que esta Europa passou a querer portugueses nas suas equipas, mas não.
Agora, os nomes que não chegamos a decorar (porque saem cada vez mais jovens) são substituídos por outros jovens que não teremos tempo de admirar.
Entretanto, as ruas estão vazias.
As parabólicas enferrujam nos telhados e é tudo digital.
Nestes tempos em que a rua morreu, a televisão é um suporte virtual e o que interessa são os milhões que se arrecadam e transaccionam.
Também os traseiros mudaram.
Assistíamos aos jogos em degraus de betão, às vezes tão frio que ficávamos com o rabo dormente. Na maior parte das vezes assistíamos de pé, à chuva, divertidos ou infelizes. O bilhete era popular e dava para as economias.
Neste novo século temos de ter muito dinheiro para o futebol, não apanhamos frio ou chuva e se formos para lugares mesmo muito caros até nos trazem comida.
O futebol como espelho de uma democracia superior acabou
Os miúdos já não querem ver os jogos reais.
Nem os polacos.
Agora através de uma maquineta extraordinária jogam com as equipas que quiserem contra quem calhar, podendo mudar uma equipa inteira e, imagine-se colocar-lhes cabeças de panda.
O jogo virou entretimento. Deixou a fantasia e até o desporto está a ir embora. A história dos clubes ainda suporta aquele desejo de pertencer a um grupo que imitávamos na rua. Não por serem super-homens, ganharem muito ou venderem aparelhos de barba. Imitávamos porque queríamos fazer felizes os nossos pais.
Lembro-me de vê-lo, em jovem, a roer as unhas de ansiedade, corpo curvado para o rádio, não fosse alguma palavra escapar à orelha. Lembro-me de torcer pela equipe dele porque me custava vê-lo sofrer, como os olhos se iluminavam quando falava dos grandes jogadores do seu clube (não do coração mas das entranhas) e da semana de doces em casa quando éramos campeões.
Lembro-me da alegria que era ser da equipa daquele homem severo e distante que poucas vezes vi sorrir e que me fazia ir para a rua jogar à bola com outros miúdos que sonhavam ter um lugar no coração de alguém.
Porque a responsabilidade de um futebolista é ocupar o coração das pessoas. Não importa o seu comportamento exemplar ou não (Cantona e Belfort Duarte são faces de uma mesma moeda).
Importa aquilo que tiveram de único e imemorial na nossa crença de que é melhor jogar futebol na rua e esquecer a hora do jantar.








Vinhas